Você não vai acreditar, mas “Garota Exemplar” tem duas horas e meia de duração e ainda dá vontade de ver um pouco mais. Mal deu para sentir o tempo passar. Também pudera. O filme é baseado no best-seller de suspense de Gillian Flynn e quem leu o livro sabe muito bem a quantidade de reviravolta, loucura e momentos bizarros que acontecem na trama.
A direção é de David Fincher, que anda obcecado por histórias gigantes, deliciosas e assustadoras. Após filmar com maestria o volumoso best-seller “Os Homens que Não Amavam as Mulheres”, de Stieg Larsson, o cineasta norte-americano agora traz para o cinema a vida de um casal em crise matrimonial, uma história já lida por mais de 4 milhões de pessoas mundo afora (perdendo somente para a saga “Cinquenta Tons de Cinza”).
Ben Affleck é um cara meio perdido chamado Nick…
Ele é casado com Amy, vivida pela atriz Rosamund Pike. Os dois estão juntos, felizes e parecem ser o casal perfeito até que a crise atinge o matrimônio e a esposa desaparece do nada, deixando apenas uma cena do crime para ser desvendada dentro da própria casa. A cidade de Missouri, nos EUA, começa a se simpatizar com a causa e prestar atenção na tragédia e tenta ajudar a encontrar a mulher desaparecida. Será que o marido gente fina e perfeito tem alguma culpa por causa do sumiço da mulher? Ele tenta colaborar com os policiais para desvendar o caso, mas a mídia transforma o acontecido num circo absurdo e começa a suspeitar da inocência do personagem interpretado por Ben Affleck. O que acontece daí pra frente é de cair o queixo. Com o passar do tempo, Nick vai se tornando o principal suspeito do sequestro (ou seria homicídio?), mas ao começar a investigar o caso por conta própria ele nota que…
O grande trunfo de “Garota Exemplar” é ter uma ótima história em mãos
E também saber levá-la para o cinema com ritmo e suspense na medida certa. Também pudera. A roteirista do filme é a própria Gillian Flynn, a autora do livro. Não leu ainda? Ótimo. Vai gostar ainda mais. O filme será um prato cheio de mistérios e surpresas que vão te surpreender até o último minuto (aliás, que final é aquele? Precisamos discutir isso depois que todo mundo assistir ao filme). Ao término de “Garota Exemplar”, você nota que a história não é somente sobre um casal, mas sim uma crítica à sociedade norte-americana e sua mediocridade. Principalmente por causa da obsessão em julgar e observar a vida alheia ao acompanhar histórias escabrosas e participar do circo formado pela mídia. Por conta disso, dá até para entender por que o personagem do Ben Affleck é aquele cara meio “cagado”, meio sem vida, sendo somente um receptor de más notícias, como se fosse um retrato da apatia dos EUA. Foi proposital, obviamente. Mas eu ainda acho que esse filme merecia um protagonista melhor e não um ator também de uma nota só como Affleck. No começo do filme ele é até bem aproveitado e a apatia funciona e faz sentido. Mas quando a história começa a soltar bomba atrás de bomba (umas que podem até mudar o rumo da vida do personagem), faz falta ter um ator que consiga reagir melhor e de acordo com as circunstâncias.
Mas não é nada que estrague o filme, que conta com um elenco impecável ao redor de Ben.
A começar pela eposa Amy, interpretada pela britânica Rosamund Pike. Escolha perfeita para o papel. Ela é ótima para os momentos de humor bizarro da história, para o sarcasmo dos diálogos. Uma excelente escolha para o papel de uma esposa meio fantasma, meio louca, meio lunática, daquelas mulheres que você mal consegue “ler” os sentimentos que carrega.
Outra grande atuação é da atriz Carrie Coon, que faz a irma gêmea de Ben Affleck. Ela sim vive cada momento de tensão com o choque necessário, sem perder as estribeiras e mantendo a carga emocional adequada para cada situação.
E não podemos deixar de falar do Neil Patrick Harris, que interpreta um ex-namorado da sumida Amy. Por ser um personagem meio psicótico e possessivo, tinha tudo para errar a dose, mas Neil faz com maestria, sem forçar demais na caricatura.
Mas vale dizer que este mal parece um filme de David Fincher. Pelo menos esteticamente falando. Esqueça a fotografia sombria, os planos criativos, etc. Em “Garota Exemplar” tudo está bem prático, claro e focado 100% na narrativa. Trata-se de uma escolha perfeita da direção. Quando se tem história tão bizarra e cheia de reviravoltas, menos é mais. O roteiro já faz todo o trabalho. Ah! Palmas também para a trilha-sonora espetacular de Trent Reznor e Atticus Ross.
Lembra quando “Clube da Luta”, em 1999, também dirigido por David Fincher, tinha tudo a ver com o momento capitalista/consumidor vivido pelos EUA na época? O mesmo acontece com “Garota Exemplar” para os tempos atuais. O filme não se mostra só como um ótimo suspense e drama obscuro sobre relação matrimonial, mas também como uma sátira cheia de humor negro sobre nossa atual cultura obcecada por fofoca dispensável e reality show. O filme faz de nós esse tipo de telespectador ao nos colocar para ver uma história inacreditável de tragédia familiar dos EUA. Ao mesmo tempo que espanta, fascina e diverte de um jeito macabro, deixando você ligado e interessado até o fim. Somos culpados também. Medo, tá? ( Fonte- papel Pop )